Porto Alegre superava os anos de ranço "emepebista" soltando a bunda. As barbichas, batas e o iogurte natural cediam lugar, na Famecos*, para o colorido New Wave ou o preto Punk. As festas mudavam de endereço. Ou os endereços mudavam de estilo. Sai Alceu Valença, Geraldo Azevedo e afins para a chegada do Clash, B-52´s ou Blitz, conforme o gosto do freguês.
Se antes já havia um desbunde caetanístico, a partir dali começou a rolar um certo "liberou geral". Jamais esquecerei uma colega reclamando para o professor Roberto Ramos que não estava certa aquela beijação geral em sala de aula. Que ela não precisava ver homens e mulheres, homens e homens, mulheres e mulheres se beijando. Tomou uma rasteira do Bob e uma vaia geral. Sua demanda não prosperou e a putaria tomou conta, como era saudável numa pós-ditadura política e tempos pré-HIV (ou notícia de).
As noites eram intermináveis. Na Osvaldo Aranha do Ocidente e no roteiro gay, que já naqueles dias promovia as melhores "baladas" (palavrinha destestável). Dentro deste roteiro lembro bem do Pantheon, um dos mil estabelecimentos que ocuparam o mesmo número da av. Independência. Acho que a danceteria, como se chamava na época, era do Messias mas seu preposto com certeza era Frey Rocha.
E Frey, um ex-padre, transformou o Pantheon num sonho para ele. Uma gordinha figura romana, era muito engraçado ve-lo em longas túnicas e sandálias. Mas, devo reconhecer, tinha bom gosto para a escolha dos garçons/michês. Um mais espetacular que o outro, todos à altura do nome da casa.
Eu e meu séquito nos acabávamos dançando ali (e em onde mais houvesse pista). Mas durou pouco. Um dos Lépidos**, talvez o que mais combinasse com aqueles vestidinhos "mula manca" (uma só alça) e sandálias trançadas, se encantou por mim. Não vou dizer se por minha formosura, inteligência, graciosidade ou dinheiro (??), mas o fato é que o tal até flores, rosas lindas, mandava. E devo reconhecer que depois dele raros o fizeram.
Só que isso acabou com meus dias de Pantheon de forma bizarra. Descontente com a atenção que seu principal garçon me dispensava, Frey voou em minha direção, aos berros, dizendo que a partir daquele dia eu estava proibida de entrar no seu reduto. Motivo, segundo ele: "tem gente que vem aqui e gasta muito dinheiro pra ser atendido por ele, que fica apenas te (sic) cercando."
Ser expulsa do Pantheon como uma semi-deusa qualquer é uma das minhas melhores memórias. Só se igualando a minha excomunhão.
* Famecos - Faculdade dos Meios de Comunicação Social da PUC porto-alegrense
**Marco Emilio Lépido, amante de Calígula
Obs.: O envolvimento com tal garçon não passou de uma "platonice" da parte dele. Não por ser garçon e nem por ser, supostamente, michê. Um dia, diante de um cartaz que anunciava a peça "A Metamorfose", ele leu em voz alta que era do KRAfka. Disso eu não dava conta.