Estava em Camboriu quando meu amigo de longa data, Ricardo Severo, mandou um SMS avisando que se encontrava em Curitiba para a estréia da peça Travesties no Festival de Teatro e que tinha dois ingressos me esperando para o espetáculo. Ricardo é um querido e eu jamais perderia a oportunidade de vê-lo, ainda que na correria de uma estréia. Voltamos, pois.
E aqui começa mais uma prova de que só está sozinha quem quer. Alô amigas encalhadas! Até esta que escreve sabe que isso é a mais pura verdade. E explico.
Minha sogra faleceu há poucos dias e o clima aqui em casa no momento não é exatamente festivo ou mesmo social. Logo, se quisesse ver meu amigo no teatro teria que encontrar outra companhia. Como no mundo adulto as pessoas são chatas demais, não encontrei alguém disposto a colocar uma roupa, entrar no carro e ir para o teatro em meras duas horas. Quando adolescente isso seria fácil pois o amigo solicitado não trocaria de roupa, largaria o que estivesse fazendo por um ingresso grátis e jamais teria preguiça de pegar um ônibus, que dirá um carro. Enfim... adultos. Não consegui pessoa alguma que me acompanhasse.
Lembrei dos tempos de faculdade, quando estar sozinha jamais foi impedimento para qualquer coisa (as noitadas no Ocidente que o digam), tomei banho, coloquei uma roupinha bacana e lá fui eu. Chegando à portaria já encontrei meus ingressos e Ricardo me pergunta: "você está esperando seu amigo"? E eu, meio envergonhada, respondi que sim.
Esclareço que não estava envergonhada por ter ido sozinha mas sim por não ter avisado em tempo hábil que iria sozinha, de forma a permitir que aquele ingresso de sua cota pudesse ter servido a outro amigo que por acaso Ricardo quisesse ter chamado. Esta era minha vergonha. Uma coisa meio luterana (que não sou) de combate ao desperdício.
Então tive a idéia de dar o ingresso para alguém e fui até a fila da bilheteria. Em uma rápida análise que descartou vários casais, um estudante rastafari e uma mocinha bicho-grilo, optei por um rapaz sozinho, precocemente grisalho e com uma cara que julguei "boa". Me aproximei e fiz a oferta. Gente! O sorriso incrédulo que ele escancarou foi comovente até. Pura alegria.
E seguimos para nossos lugares. Descobri que o nome do moço é Jairo e que trabalha no setor de embalagens de papelão. Que gosta de teatro, estuda economia e que havia programado assistir aquele espetáculo com a namorada mas o namoro terminou antes que chegasse o dia da peça. E brincou: "vou ter que contar pra ela o que aconteceu". Quanta justiça neste mundo. Parece que os ingressos ficaram com ela e que já tinha convidado uma amiga para acompanhá-la, deixando o pobre na mão.
O que eu quero dizer, depois desta ladainha toda, é que foi um "encontro" literalmente às cegas e muito agradável. Jairo revelou-se (ao menos em um primeiro momento) um cara simpático, bom papo, educado, aberto a novas e diferentes pessoas.
E eu, que sou casada há 20 anos (somando casamentos), conclui que não perdi a forma. Não que ele tenha me dado trela pois não houve qualquer clima para isso. Mas não perdi a forma para escolher bem. Escolhi com base em rápidos critérios puramente visuais e pimba. Uma noite agradável.
E foi então que mais uma vez fiquei com dó da série de amigas solteiras e reclamonas. Abram os olhos e os corações. Encarem a fila do teatro, do cinema, do supermercado... o mundo deve estar cheio de Jairos e vocês ali pensando que se o cara está sozinho em uma noite de sexta é porque deve ter algum problema ou qualquer bobagem do tipo.
Até esta "senhôra" ontem teve materializada a máxima que diz que "a fila anda". Mas tem que estar ao menos na fila.