Só se fala, sente e se conversa sobre frio aqui em Curitiba. Dizem que os primeiros dias de frio são os piores porque depois a gente acostuma. Em geral pode ser verdade, mas desta vez, além do fator "hábito", coincindiu que o frio foi frio de verdade. Um frio que dispensa botox... a gente coloca a cara no vento e ela congela. Frio com vento que me fez lembrar alguns pânicos da infância. Quando era criança morava no bairro Menino Deus, em Porto Alegre, antes dos últimos aterros e construções que deixavam o Guaiba (seja ele rio ou estuário) mais perto da minha antiga casa do que seria hoje. Era muito pequeninha e magrela e, como toda criança gaúcha, usava poncho (ou pala) para me proteger do frio. Uma tarde, voltando do Clube do Comércio pela Av. Bastian em direção à Praia de Belas, começou um vendaval, o famoso "Minuano", que transformou meu pala numa vela. Tive que me agarrar num poste pra não ser carregada. Quanto mais o pano estufava, mais me agarrava ao ferro. Além do natural pânico, para piorar a situação a culpa começava a assolar minha alma de 10 ou 11 anos. Na minha imaginação quase pueril, passava por aquilo por ter fugido de casa. Sim, era a primeira e última vez que fugia de casa e logo aquilo me acontecia. Mesmo com sério motivo pra sumir, para abandonar minha família e cair no mundo, aquilo só poderia ser castigo! Havia fugido por causa de um fato que, para mim, era a prova cabal de que minha mãe não me amava. O que me era insuportável naquele momento. Imaginem que, apesar de saber muito bem que eu as odiava, minha mãe colocou ervilhas na maionese. Se você odeia um alimento e sua mãe, que sabe disso muito bem, coloca o talzinho num prato, é o que? Ato didático? Só voltei pra casa porque ponderei que ela ao menos não havia colocado azeitona, o que, isso sim, seria imperdoável. Estas as tardes de frio! Elas vêm soprar lembranças em nossa memória. a. "Cair no mundo", para mim, consistiu em rápida visita ao protegido universo de um clube classe média alta da cidade, com suas quadras de tênis e saraus dançantes; b. minha fuga foi um total fracasso pois, por ter capitulado cedo demais, ela sequer foi sentida pela família; c. D. Alba nunca mais colocou ervilhas na minha comida mas, por muitos anos, cada vez que a visitava vinha contente contar que havia feito ambrosia especialmente para mim. Eu não gosto de ambrosia, quem gosta é meu irmão; e, d. finalmente ela entendeu que eu não gosto de ambrosia e, na última visita, preparou uma pote enorme de doce de batata doce com coco para me agradar. Bingo!!! Este é o doce das minha infância! Em tempo: Ela me ama!!!
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Frio, calafrios e paladares
Só se fala sobre frio aqui em Curitiba. Dizem que os primeiros dias de frio são os piores porque depois a gente acostuma. Frio com vento me fez lembrar alguns pânicos da infância.