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Dra. Estigma

É em homenagem a meus críticos que escrevo nesta semana só para ter o prazer de, mais uma vez, contrariá-los.

Recebo semanalmente algumas mensagens de leitores que acompanham meus escritos e de um modo geral eles estão divididos em duas categorias: os que concordam comigo sobre a baixa qualidade da televisão nacional (tem um que consegue detestar Mulher mais do eu)...e outros que reclamam que eu jamais gosto de programa algum.


É em homenagem aos últimos que escrevo nesta semana, talvez só para ter o prazer de mais uma vez ser do contra... e contrariá-los.


Você já viram um programa chamado Ponte Aérea, que vai ao ar por volta da meia-noite na TV Cultura/Educativa? Se entendi direito o programa é dividido entre o Caderno 2000 e a Rede Brasil Revista. O primeiro é um programa de variedades e o segundo é um telejornal.


Pois Ponte Aérea é de uma honestidade impar no cenário da TV brasileira. Com produção paupérrima mesmo para os padrões estatais (é bem mais modesto que Vitrine, por exemplo), Caderno 2000 diferencia-se de tudo o que há nos canais abertos.


Imagine que em apenas 30 minutos conseguiu, na última quarta-feira, abordar com rara inteligência cinema, literatura, música e balé. E sem a "literatice" pela qual algumas vezes resvalam iniciativas do gênero.


A abertura do programa foi uma reportagem sobre Orfeu, o filme de Cacá Diegues, com depoimentos de figurinhas carimbadas e outras nem tanto. É claro que abriu espaço para Caetano, o autor da trilha, consolidar-se como a mais verborrágica figura nacional (depois de Wally Salomão, que não ganha tanto espaço por razões óbvias). Mas até nisso foi eficiente.


Democrático, colocou ao lado de comentários sobre programas que são feitos com exclusividade para os países lusófonos e de uma reportagem sobre Dom Casmurro de Machado de Assis, assuntos tidos como "elevados"... uma matéria sobre o hip hop, gênero considerado por muitos uma espécie de submúsica.


Aproveitando o gancho da estréia do balé O Armário, da Bem-vinda Companhia de Dança de Minas Gerais, citou ainda a autora da obra em que o espetáculo se baseia, Clarice Lispector.


E finalmente, não esqueçam que o programa tem só meia hora, enquanto as televisões brasileiras nos empurravam duas mil e quinhentas matérias sobre os 499 anos do Descobrimento... sobre o centenário de Hitler... Caderno 2000 nos brindava com belíssimos comentários de Nando Gabrieli sobre Duke Ellington, que também estaria completando 100 anos por agora.


Viram só?! Eu não sou tão má assim. O problema é que é difícil ser engraçada quando o programa avaliado é bom. Via de regra minhas colunas são bem melhores quando eu dou risada da cretinice geral.


É por isso que às vezes eu, Dra. Estigma, tenho medo de mim mesma.