Você lembra da Maria da Conceição Tavares? Aquela economista portuguesa, residente no Brasil, que inundou as telas brasileiras ao chorar no Plano Collor, emocionada com a “salvação” que o tal representaria?
Pois Maria da Conceição Tavares voltou às telinhas e pode ser vista interpretando Patrocínio das Neves, a Titi, na minissérie Os Maias. Depois de Marília Gabriela sob a direção de Gerard Thomas, é a vez da economista mostrar seus dotes artísticos.
Brincadeirinha... o personagem é interpretado por Myrian Muniz (que deve estar de sacanagem pra cima da Tavares).
No ar há alguns dias, Os Maias chegou para renovar a dicotomia respeito-e-asco pela Globo. Respeito por reconhecer que volta e meia ela acerta... asco por não percebermos na emissora uma vontade de acertar mais constante.
O caso dá margens a um paralelo entre o que acontece com a Globo e com o mundo dos esportes. Tomemos o exemplo do tênis, que está em moda. Guga começou 2000 perdendo todos os campeonatos. Precisou mudar os planos e vir ao Chile (ao contrário de insistir nos campeonatos europeus e norte-americanos) para retomar o eixo. Venceu em Santiago e a partir daí melhorou. Ganhou uns... perdeu outros... aí vence, pela segunda vez, Rolland Garros.
Vai a Wimbledon e às Olimpíadas com a torcida brasileira pondo a maior fé... e perde. Ganha mais um ou outro torneio... perde outros... e vence o Master. Ponto. Número 1 do mundo.
Pois assim é a Globo. Faz um monte de droga... mas então grava uma minissérie que a coloca como a número 1. A indiscutivelmente melhor emissora/produtora brasileira.
Mas vale dizer que estes pontos marcados pela Globo mais uma vez se originam de uma adaptação, o que dá margens a que eu pense que realmente há uma crise de autores na casa. Os maiores sucessos (qualitativos) da Globo estão associados a Jorge Amado, Dias Gomes, Graciliano Ramos & Cia.
E o quê leva a isso? As histórias? Olha... trama pro trama não há muita diferença entre escritos de Eça de Queiroz e Manoel Carlos. Calma... não é uma heresia e explico. Ambos (e todos os escritores) discorrem sobre trapaças da vida... encontros... desencontros... amor... ódio... estas coisas que nos cercam há milênios.
Mas há uma diferença fundamental. Enquanto um autor de novelas, sejam elas globais ou não, se limita a lançar na tela uma sucessão de fatos e intrigas que parecem servir apenas para o preenchimento dos capítulos... os grandes autores da literatura os tratam (os fatos e intrigas) tão somente como instrumentos que levam a uma outra dimensão... o personagem.
Querem um exemplo para isso ficar mais claro? Vamos lá.
Laços de Família motivou protestos até de parcela da população, incomodada com a profissão de Capitu, por exemplo. Até crianças saíram temporariamente da novela por conta deste e de outros motivos.
Alguém vai reclamar que em breve teremos incesto na minissérie? Claro que não. E não apenas porque “não pegaria bem” criticar Eça de Queiroz... mas porque todos os personagens envolvidos têm vidas que sustentam seus atos, fazendo com que estes fiquem em seus lugares de meros pretextos para a história de Carlos e Maria Eduarda.
Diferença mais latente entre um e outro? Em uma novela brasileira Dom Afonso, o patriarca dos Maias, tentaria impedir o romance entre o filho Pedro e Maria Monforte tão somente por preconceito social. Em um romance de escopo isso não acontece com tanta banalidade. Na verdade Dom Afonso desaprova o envolvimento por saber que seu fracote filho, cria de uma formação católica equivocada, será devorado pela liberal e forte filha de um traficante de escravos.
Mas um questionamento aos modos e costumes da decadente aristocracia portuguesa do século XIX ainda está anos luz à frente das bobagens levantadas em nossos textos televisivos atuais. Aqui ainda acreditamos que Capitu só se prostitui por dinheiro, que é uma agente passiva no processo.
Gostaria de ver Capitu ganhar dimensão humana e tomar as rédeas da vida. Não com a redenção nos braços do pamonha Fred... mas como uma mulher decidida a domar seus “patrocinadores”.