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Quem se importa com o fim da TV?

Ao surgimento de cada nova tecnologia advém teorias catastróficas sobre o destino do que já está estabelecido.

Ao surgimento de cada nova tecnologia advém teorias catastróficas sobre o destino do que já está estabelecido. As tecnologias de informação costumam ser recordistas nestas discussões.


Foi assim no surgimento do rádio, do cinema, da televisão, do videocassete doméstico e, agora, da Internet.


Acompanhando artigos e entrevistas sobre o assunto noto uma grande diferença nos sentimentos que envolvem este e que envolveram outros embates. Se quando surgiu a televisão havia o temor que acabasse com o rádio e se ao surgimento do vídeo seguiu-se um verdadeiro pavor de que pudesse acabar com o cinema, não percebo qualquer receio generalizado sobre a possibilidade da Internet acabar com a televisão.


Primeiro porque a televisão não acabará. É possível que migre do aparelho receptor tradicional para as telas dos micros, muito embora eu acredite que, com os novos aparelhinhos que se acoplam à TV tradicional, será mais fácil internautas migrarem dos micros para ela.


Desta forma, no micro, na TV ou no equipamento que se sabe lá inventarão, a televisão não acabará. Mas mudará muito?


Com certeza sim. A começar pelas legislações vigentes.


Uma grande mudança, decorrência do mundo pós-TV-por-assinatura, é a internacionalização do que assistimos e do que assistiremos. Enquanto as leis que regem a comunicação tradicional no país ainda não permitem, ao menos não abertamente, investimentos estrangeiros... o que vemos no mundo virtual é uma sucessão de aquisições de provedores locais por empresas internacionais que passam a desenvolver aqui atividades antes restritas a empresários brasileiros, sobretudo o jornalismo.


Quer dizer... o sr. Ted Turner, dono da CNN, não pode montar uma emissora de TV no Brasil mas pode manter um portal com jornalismo. Isto já é uma mudança e tanto.


Outra mudança imediata que percebo, e esta diz respeito a mim e a meus pares, é a regulamentação da profissão de jornalista. Questão de honra há até bem pouco tempo, o discurso que defende a obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão tornou-se a coisa mais obsoleta e absurda do mundo.


Pensem bem... se o sindicato da categoria, outra instituição obsoleta, não conseguiu até hoje fiscalizar o jornal que fica na esquina... imaginem se conseguirá ter atuação no mundo do cyber-news? Quá, quá, quá!!!! 


Disse isso noite destas a universitários para os quais fui convidada a palestrar e um dos professores, sindicalista profissional, quase me bateu.


Temos então duas leis que precisam de imediata análise.


Fora isso, há também a questão da forma como a nova TV se apresentará. A mim parece inevitável que aumente a interatividade e as opções do telespectador (será ainda este o nome que receberá a assistência?). Além de escolher quando assistir este ou aquele programa, tal como boa parte dos clippings de notícias que andam por aí, poderemos escolher os assuntos que receberemos.


Isto significa que o Fantástico não acabará (acho que só a hecatombe poria fim naquilo), mas o veremos, ou não, quando quisermos e só os quadros que quisermos.


Basicamente esta será a grande diferença, a considerar os rumos que a questão vem tomando.


Isto me faz voltar a um assunto que já abordei neste espaço há mais de um ano. É impressionante como a tecnologia avança em proporção infinitamente superior às ciências humanas e que a própria arte. Não que TV seja arte, não me entendam mal... mas é feita majoritariamente por profissionais de formação humanística.


Recentemente entrevistei o professor francês Henri Dou, PhD em gestão do conhecimento, que se mostrava muito preocupado com esta realidade. Disse ele neste nosso contato, que o mundo vai ter que se dedicar um pouco mais ao conhecimento humano sob pena de ser devorado pela tecnologia. E olha que ele vive dela.


Infelizmente o que ele pensa não ganha relevância se considerarmos que é um francês, povo com vasta tradição em pensamento mas que há muito deixou de ser uma voz com alcance mundial. Pode até estar certo mas isto pouco importará em uma ordem mundial que relega filosofia e ciências afins a um plano ínfimo.


Desta forma, seja como for a futura televisão, será a mesma droga. Basta pensarmos que os meios de transmissão e os equipamentos de produção estarão sempre cada vez mais rápidos... enquanto nós, os humanos que pilotamos tudo isso, pouco avançamos em termos físicos e culturais.


Quero dizer... neguinho que se ferre pra suprir 24 horas, meses e anos de transmissão ininterrupta para esta indústria. E neguinho que se ferre ainda mais para receber a porcaria que resulta desta loucura toda.


É possível que esta até seja outra causa para a já citada falta de paixão que cerca as discussões sobre a possibilidade da TV acabar. Além de isto não ser plausível... do jeito apressado e descuidado como é feita, quem se importaria?